Voltar

Sergio & Eduardo Abreu (Duo Abreu)

Nascimento:

Natural de: Rio de Janeiro (RJ)

Um dos maiores duos de violão do mundo, apesar da breve carreira. Sérgio Abreu também faz história como o mais famoso luthier brasileiro
Sergio & Eduardo Abreu (Duo Abreu)

Imagens

Discografia

Bibliografia

Por Gilson Antunes

Os irmãos Sérgio e Eduardo Abreu formam, ao lado do Duo Assad, os dois maiores duos do violão brasileiro e estão entre os melhores do mundo, em todos os tempos. Os discos dos Abreu nunca foram lançados em CD, nem constam em aplicativos streaming como Spotify e Deezer. E existem pouquíssimas e breves imagens deles em vídeo. Apesar de tal ausência no mercado fonográfico, são venerados por violonistas dos quatro cantos do planeta, do Brasil à Austrália, dos Estados Unidos à Inglaterra. Nesse último país, são considerados mitos do violão, pelas históricas apresentações, as gravações para a Rádio BBC e as masterclasses ministradas em importantes estabelecimentos musicais. 

No Brasil, Sérgio e Eduardo também representam referências máximas. As novas gerações, por meio da internet e do compartilhamento digital dos discos, também aprenderam a admirar a destreza técnica e o amadurecimento prematuro desse duo, que encerrou as atividades em 1975, quando Sérgio contava com apenas 27 anos de idade e Eduardo com 26. 

Formação

(Sergio Abreu, Monina Távora e Eduardo Abreu)

Sergio Rebello Abreu nasceu no Rio de Janeiro em 05 de junho de 1948, enquanto Eduardo, de mesmo sobrenome e também carioca, é de 19 de setembro de 1949. Filhos de Osmar Salles Abreu e Maria de Lourdes Rebello Abreu, os irmãos iniciaram os estudos de violão com o avô, Antonio Rebello (discípulo de Quincas Laranjerias e de Isaías Sávio) em 1959, prosseguindo com o pai Osmar e, a partir de 1961, com a violonista e alaudista argentina Adolfina Raitzn de Távora, mais conhecida como Monina Távora (discípula de Andres Segovia e de Domingo Prat). As aulas com ela eram quinzenais – sempre aos finais de semana - durante os dez anos seguintes, e com quem mantiveram contato durante toda a carreira. 

Monina viera ao Brasil acompanhar o marido, Elysiário Távora Filho (um dos maiores geólogos brasileiros e descobridor da “tavorita”), que à época havia conseguido emprego no Rio de Janeiro. 

Em termos de matérias teóricas, Sérgio e Eduardo Abreu estudaram com Florêncio de Almeida Lima. O compositor italiano radicado no Uruguai Guido Santorsola também foi uma grande influência, oferecendo conselhos e, posteriormente, dedicando algumas obras aos irmãos.

Em 1962, Sérgio e Eduardo fizeram curta aparição num recital no Conservatório Brasileiro de Música, deixando para o ano seguinte a estreia oficial do duo na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), onde tocaram novamente em 1964. Já no ano seguinte deram dois recitais em Buenos Aires.

As apresentações iniciais ocorriam com intervalos largos de tempo, o que possibilitava o amadurecimento do repertório, por meio da orientação sempre presente de Monina Távora. A empresária Sulla Jaffe, observando o rápido desenvolvimento dos irmãos, também os colocou em importantes séries de concertos em todo o mundo, abrindo assim espaço para uma futura carreira internacional.

Primeiro disco

Em 1967 Sergio Abreu venceu o maior concurso de violão do mundo (o da ORTF em Paris), sendo o mais jovem violonista até então a conseguir esse feito. Eduardo Abreu conquistou a segunda colocação do mesmo prêmio no ano seguinte. A partir daí eles finalmente fizeram a estreia europeia em Londres, o que lhes valeu um contrato com a CBS em 1968 e o lançamento do primeiro e histórico disco do duo: The Guitars of Sergio and Eduardo Abreu.

Esse primeiro registro, que acabou saindo pela Decca (gentilmente cedido pela CBS, desde que fosse apenas um disco), é formado tanto por peças em duo (de autores como John Dowland, Frecobaldi, Vivaldi, Scarlatti e Ravel) como peças solo (a exemplo Bach e Villa-Lobos), mostrando assim a capacidade dos irmãos como solistas e cameristas. O resultado não agradou tanto a Sérgio Abreu, que considera a gravação improvisada e com problemas de edição.

A carreira do duo prosseguiu estável no Brasil, Estados Unidos, Inglaterra e Austrália, principalmente. As séries em que se apresentavam contavam com os principais músicos do mundo, entre eles Julian Bream, Placido Domingo, Martha Argerich, Rostropovich e Pierre Boulez. Vale lembrar que ambos tinham pouco mais de 20 anos e já trabalhavam com o empresário Harold Shaw (o mesmo de artistas como John Williams, Jacqueline Du Pré e Vladimir Horowitz).

CBS e programas de rádio

Em 1969 gravaram o segundo disco, agora com repertório inteiramente dedicado ao duo de violões, que foi lançado também no Brasil sob o título Os Violões de Sérgio e Eduardo Abreu. As peças abrangem compositores como Anon, Telemann, Scheidler Rodrigo, Granados e Falla.  

No ano seguinte, saiu o terceiro e último LP do duo, também pela CBS, com os concertos para dois violões e orquestra de Guido Santórsola e Castelnuovo-Tedesco. A ideia inicial era gravar o Concierto Madrigal, de Joaquin Rodrigo, em vez do concerto de Santórsola mas, como a partitura demorou a chegar, eles resolveram registrar a obra do ítalo-uruguaio, que já estava estudada. A gravação desse concerto é tida por muitos como a melhor já realizada pelo duo.

Existem inúmeras gravações não comerciais ao vivo em recitais e em programas de rádio que demonstram também a imensa capacidade técnico-musical do duo. Entre estas célebres interpretações podem ser citadas a da Suite para violão solo de Castelnuovo-Tedesco (gravada num recital no Teatro Municipal do Rio de Janeiro por Eduardo Abreu) ou a das Variações e Fuga sobre as Folias de Espanha de Manuel Ponce (na gravação ao vivo de Sérgio Abreu para o concurso de Paris). Essas gravações, difundidas por sites de compartilhamento de músicas, nos mais diversos formatos digitais – como MP3 e Flac – fazem a alegria de violonistas. Algumas delas estão disponíveis aqui na discografia do Acervo Violão.

O Duo Abreu manteve-se em contato com o repertório principal da época, tendo tocado obras de compositores como Guido Santórsola (Sonata a Duo, Concerto), Radamés Gnattali (Sonatina para Dois Violões e Violoncelo) e Willy Burkhardt (Toccata). Ao mesmo tempo, Sérgio fez a primeira audição brasileira do Nocturnal, de Benjamin Britten, e Eduardo a primeira audição brasileira da Sonatina, de Lennox Berkeley, em 1968.

Sérgio Abreu solo

Em novembro de 1975, cansado da vida social ocasionada pela carreira musical, Eduardo Abreu resolveu largar o duo e o violão profissionalmente, após uma apresentação em Washington, nos Estados Unidos. Sérgio Abreu teve que cumprir contrato e gravar mais um disco, que se tornou também um dos mais festejados já lançados por um violonista: Sérgio Abreu interpreta Paganini e Sor. Este LP foi gravado entre 1976 e 1977, logo após a dissolução do duo, mas foi lançado apenas no início da década de 1980 por outra gravadora, a Ariola, com uma única tiragem. 

Em 1977, Sérgio também participou da gravação de um disco com canções de Heitor Villa-Lobos interpretadas por Maria Lúcia Godoy. Sérgio havia conhecido a cantora em Londres, durante apresentação em que os irmãos tocaram o Concerto para Dois Violões de Castelnuovo-Tedesco, sendo que no mesmo programa, Maria Lúcia interpretou as Bachianas Brasileiras nº 5, de Villa-Lobos.

Outro duo que marcou época, mas que infelizmente ainda não se conhece nenhum registro, é o de Sérgio Abreu com o flautista Norton Morozovicz. Eles se conheceram durante uma apresentação de Sérgio com a Orquestra Sinfônica Brasileira e tocaram juntos por apenas dois anos.

Luthier

Por volta de 1982, Sérgio Abreu decidiu também encerrar a carreira de concertista por estar decepcionado – em suas próprias palavras – “com a carreira, com o público e com a técnica”. Desde 1978 ele já havia começado a construir violões, atividade que aprendeu de maneira informal com os luthiers David Rubio e Paul Fischer, tendo trabalhado por sete anos (entre 1980 e 1987) na empresa de violões brasileira Giannini, onde ajudou a produzir alguns dos melhores violões semi-artesanais do Brasil, o Giannini Modelo Abreu, também conhecido como C7. 

Sérgio construía os tampos no Rio de Janeiro e os levava uma ou duas vezes por mês à Giannini, ajustando a pestana, regulando o rastilho e dando o aval para comercialização. Ao todo foram quase 500 violões construídos naquela fábrica – 497, mais especificamente, pois as madeiras haviam acabado – o que lhe deu metiér para seguir nessa atividade. Mas, ao sair, já havia construído sozinho por volta de 30 violões. 

Sérgio passou a construir violões de maneira autônoma, em sua oficina no bairro carioca de Copacabana, tendo como modelo os instrumentos de Hermann Hauser. Entre outros luthiers que também o ajudaram na arte da construção estão o americano Thomas Humphrey e o inglês George Lowe.

Atualmente, Sérgio Abreu é o mais famoso e requisitado luthier brasileiro, construindo entre 12 e 15 instrumentos por ano, enquanto Eduardo Abreu segue na Pensilvânia, nos Estados Unidos, onde trabalha como engenheiro eletrônico. 

Em 2007, numa entrevista à revista Violão Pro, foi perguntado a Sérgio Abreu se haveria alguma possibilidade de voltar a tocar violão solo novamente, e ele respondeu que para isso ocorrer teria que deixar a luteria, algo improvável. Curiosamente, Sérgio Abreu jamais chegou a dar um recital em um violão construído por ele mesmo. 

Biografia e vídeos

Uma série de descobertas recentes por meio de pesquisas e a revelação de documentos inéditos têm reafirmado a genialidade dos irmãos Abreu. O primeiro passo foi dado pelo luthier, pesquisador e presidente do Fórum do Violão (www.violao.org), Ricardo Dias. Em 2015 ele publicou o valiosíssimo livro Sérgio Abreu: uma biografia, com mais de 50 fotos. Também catalogou as gravações não oficiais do duo. 

Entre novembro de 2015 e fevereiro de 2016, o meio violonístico e a crítica especializada ficaram surpreendidos e eufóricos quando o selo Meloclassic descobriu e disponibilizou no YouTube cinco vídeos inéditos, de 1969 a 1975, sendo quatro do Duo Abreu (interpretando três peças de Jean-Philippe Rameau, Intermezzo, de “Goyescas” (Granados), La Vida Breve (Falla) e Tonadilla (Rodrigo) e um solo de Sergio Abreu (o Prelúdio 1, de Villa-Lobos). 

Os vídeos, que podem ser conferidos aqui, foram descobertos casualmente, depois que o violonista paulista Glauber Rocha entrou em contato com a equipe do selo e perguntou se dispuam em catálogo de algum filme sobre o lendário duo. Os pesquisadores do Meloclassic iniciamente disseram não haver vídeo algum. Mas depois de alguns dias descobriram as fitas. Até então, a única aparição em movimento dos irmãos Abreu era uma apresentação no programa de TV Fantástico, da Rede Globo, em 1974. 

Em fevereiro de 2016, o violonista Marcelo Kayath, por meio do selo Guitar Coop (www.guitarcoop.com.br), produziu uma alentada entrevista com Sérgio Abreu, na qual conta detalhes de repertório, gravações e concertos realizados com o irmão Eduardo. E assim o Duo Abreu e a carreira solo de Sérgio continuam inspirando violonistas em todo o mundo.

Discografia 

The Guitars of Sérgio and Eduardo Abreu (Decca, 1968)

The Guitars of Sérgio e Eduardo Abreu (CBS, 1969)

Two Concerts for Two Guitars by Castelnuovo-Tedesco and Santorsola (CBS, 1970)

Gravações não oficiais

Sergio & Eduardo Abreu: The 1970`s BBC Recording (1970)

Duo Abreu Live Town Hall NY (1974)

Sergio & Eduardo Abreu: The 1975`s BBC Recording (1975)

Sergio Abreu ao vivo em Belém (1977)

Discos de Sergio Abreu

Sérgio Abreu interpreta Paganini e Sor (Ariola, 1980)

Maria Lúcia Godoy interpreta Heitor Villa-Lobos (Polygram – Phillips, 1977)

Livro

Sérgio Abreu: uma biografia, de Ricardo Dias (Independente, 2015, 256p.)

Ajude a preservar a memória da nossa cultura e a riqueza da música brasileira. Faça aqui sua doação.